segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Ecologia dos Afetos


Tanto se fala de desmatamentos de florestas, de desertificações, de ações humanas que geram desequilíbrios ambientais dos mais diversos no meio-ambiente.Tanto se fala da relação não solidária do homem com os espaços físicos no qual a comunidade humana se desenvolve e habita.Mas tão pouco se fala da relação do homem com o outro homem no que diz respeito ao desequilíbrio da ecologia-emocional dos afetos nas relações com o outro. Nunca vi nenhum abaixo-assinado contra o aquecimento do individualismo e da indiferença em relação a dor alheia; nem passeatas contra a desertificação da vontade genuína, do desejo livre, da gratidão e da compaixão no solo-corpo-emocional-coletivo do seres humanos destes tempos de autoritária “mercadocrácia” que transforma os corpos em mercadoria. Nunca vi ninguém na rua protestando contra a ausência de amor e solidariedade nas relações humanas. Acho isso muito estranho, pois a Teia da vida a todo momento apresenta suas afetivas conexões e inter-relações entre os seres. Os nós e os laços são visíveis a todo momento.
Tudo que o homem faz com a Terra tem o seu início naquilo que ele faz com o outro ser ao seu lado. O meio ambiente começa nos espaços entre (e com) as pessoas. Talvez, o maior desequilíbrio ambiental que o homem atual esteja gerando nesse momento histórico no Planeta Terra, seja o de se distanciar do outro ser que está próximo. Talvez seja o de obedecer (às vezes de maneira inconsciente) a imposição de uma norma de mercado que coisifica o ser e gera distâncias que interditam o semear de novas composições mais afetivas nas relações humanas.Uma norma predatória que se sustenta na produção de diversos tipos de desertos (internos e externos).Talvez,para que seja mais efetiva as nossas ações atuais de des-poluição do meio-ambiente externo, tenhamos que despoluir os nossos próprios sentidos e o nosso próprio coração, capturado e cooptado por uma invisível força de poder que des-semeia a potência dos afetos no solo da vida e nos impõe uma máscara que oculta nossa face mais orgânica.

 

 

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Alma nua


O tecido oficial que me cobre a pele viva,

só me retalha em moldes e modelos.

Me impõe uma roupagem que sufoca

os sentimentos, os sonhos e as utopias.

Tento romper com poesia a moda

do controle das linhas da emoção.

Rasgo a pesada vestimenta de couro

confeccionada na fábrica da convenção.

A vida vestida em explicações de racionalidade

ou enfaixadas em fugazes diversões ,

 só servem para encobrir o medo

de se sentir  sem o uso de uniformes.

Este medo que invisivelmente desfila

nas passarelas de tantas e tantas solidões

aprisionadas na superfície de tantos espelhos.

Num impulso de liberdade a todos os poros do mundo,

exponho na vitrine deste instante, meu peito nu

e o meu coração solitário e sonhador de poeta.

Nele pulsa a vontade de um tempo novo.

Um tempo de desejos sem ponteiros,

sem fronteiras, sem trajes e ultrajes.

Um tempo que teça espaços para uma vida nua,

onde o encontro seja a roupa que o corpo procura.

Meu coração de poeta sonha com a nudez absoluta

de um único coração-coletivo e cósmico.

Um coração único que pulse seu pulso

nos afetos compartilhados por mãos

que não tenham medo de se despirem de suas luvas.

Meu poeta de coração despido sonha um mundo

feito por mãos nuas que vistam o tempo com afetos,poesia

e encontros humanos que revelem a nudez da alma.

Tempo de silêncio


Entre tantas vozes,

com a qual me identifico?

Sem lateralidade,

o espaço fica esquisito.

Uma outra visão de tempo

vai nascendo desse conflito.

O corpo não tem lados

na perspectiva do infinito.

Não há identidades

no nascer desse novo mito.

O tempo é de silêncios,

não de gritos.

O corpo da liberdade


O corpo da liberdade.
O desejo humano de liberdade não pode ser só uma febre passageira no corpo doente do poder, ele precisa ser uma infecção generalizada que faça esse corpo, já moribundo, definitivamente morrer no seu funcionamento opressor. Ações coletivas de cóleras contidas; efêmeras manifestações públicas sem o calor dos afetos privados; atos de rebeldia e auto-afirmação juvenil não vividos com os pais e projetados numa idea de país; gritos anacrônicos enfaixados em refrões débeis e lateralizados; agrupamentos humanos marchando sem um elo afetivo, só alimentam mais o movimento desse obsoleto sistema mantido por articulações perversas e ossos calcificados em gestos invisíveis de controle social. O território novo, que precisa ser criado nesse momento histórico da humanidade, para que a liberdade humana de fato flua, é um lugar existente e ainda não explorado dentro da própria consciência humana. Um lugar outro... Um lugar que não é só habitado por “signos que se solidarizam” em nome de um significado convencionalizado;  uma racionalidade que dita regras de controle para uma suposta  ordem no caos do corpo individual e coletivo; de explicações sustentadas na arrogância de um intelecto formatado para neutralizar as paixões e gerar pensamentos categorizantes sobre os fenômenos que ocorrem no ser e no mundo.Esse lugar outro é um lugar onde o outro também nos constitui e nos compõe e descompõe constantemente. (O outro-tudo não é um lugar utópico.)Esse lugar outro é o lugar no qual ocorre a ruptura do conceito de individualidade isolada que progride na linha de um tempo programado em etapas competitivas determinadas.Pois  esse conceito de individualidade é o coração de bílis que bombeia o virulento sangue no corpo do poder estabelecido que aprisiona, envenena e manipula o próprio desejo de liberdade humana. A liberdade se inicia por dentro, na libertação de si mesmo em relação ao que se entende sobre si mesmo , sobre o regimento dos afetos nas relações com o outro e sobre apreensão intuitiva das forças do corpo do poder que atuam dentro do corpo de cada ser e por conseguinte no movimento do corpo-coletivo em suas ações de liberdade no mundo.

segunda-feira, 11 de março de 2013

CORAÇÃO OCEANO

Sinto a força de oceanos borbulhando dentro de mim.


Um mar e suas encostas rochosas

se movimenta pelas minhas vértebras e artérias porosas.

Deságuo-me em águas incertas pelos desapelos da pessoa encoberta.

Os pensamentos cansados vertem suores pela testa.

Na caixa torácica uma emoção sem nome certo

e com raízes em abandonos abissais,

se expande e se encolhe em movimento de ondas.

Contrações e expansões de marés involuntárias

criam momentos de aperto e de falso alivio no órgão cardíaco.

Neste coração que se partiu ancorado na dor

de um amor que viu quebrar-se o seu farol,

um corpo respira como se fosse um solitário peixe no escuro.

Quando enganado por Netuno, Eros sempre acaba em solidão.

Nos excessos das emoções afogadas em densas águas,

só as lágrimas criam os olhos para uma nova terra à vista.